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02 novembro 2023

Artigo_Técnicas para melhorar a durabilidade da construção em terra_Rute Eires_Aires Camões_Maria Ponte

Técnicas para melhorar a durabilidade da construção em terra 

Rute Eires1 & Aires Camões1

C-TAC, Universidade do Minho, Departamento de Engenharia Civil Azurém, P - 4800-058 Guimarães, Portugal 

Maria Ponte2

Universidade de Coimbra, Departamento de Arquitectura, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Coimbra Portugal

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5 - ESTABILIZAÇÃO DO MATERIAL TERRA PARA AUMENTAR A DURABILIDADE 

Entre os estabilizantes mais utilizados na construção em terra desde a Antiguidade encontra-se a cal. 

Este material tem sido adicionado ao solo para construção de paredes em terra e para preparação de argamassas à base de terra, utilizando-se diferentes tipos de cal, sendo sobretudo utilizada cal aérea hidratada, Ca(OH)2, ou cal viva, CaO (Eires, 2012). 

O principal propósito desta adição é incrementar as resistências mecânicas e a resistência à ação da água. Este aumento pode ser explicado através da reação de carbonatação que ocorre na cal na presença de CO2, mas também pela reação pozolânica entre partículas de argila presentes no solo e cal (Santos, 2010 in Eires, 2012). 

A incorporação de biopolímeros na construção em terra, também tem sido utilizada a fim de melhorar o seu comportamento face à ação da água. Existem inúmeros exemplos de biopolímeros que têm sido usados como complemento estabilizante do solo. 

Alguns são de origem vegetal, tais como farinhas, amidos, gomas, cato, óleos, ceras ou resinas de plantas, outros de origem animal, como gorduras animais, soro de leite, caseína, claras de ovos, sangue, excrementos e urina (Eires et al, 2010). No presente texto os biopolímeros são considerados como polímeros de origem natural e biológica, sem qualquer tipo de síntese laboratorial. Entre estes biopolímeros, os óleos ou gorduras, têm sido os mais utilizados para tornar os edifícios em terra mais impermeáveis. Estes materiais são sobretudo incorporados na hidratação da cal, mediante dois métodos distintos na sua preparação. Pode ser por simples hidratação, juntando-se óleos ou gorduras com a cal e a quantidade adequada de água para a hidratação, adicionando-se posteriormente essa mistura no solo a ser estabilizado, ou pode ser utilizado um processo chamado "hidratação a quente", misturando simultaneamente o solo ou areia argilosa com óleos e gorduras com a água necessária (Eires, 2012). 

Em termos históricos, a hidratação de cal com óleos já foi citada por Vitrúvio, que mencionou sobre tubos de barro para a água o seguinte: "as juntas terão de ser revestidas com uma mistura de cal viva e óleo", Vitruvius (século I a.C.). No século XVI, o refugo de óleo de baleia, que era utilizado na iluminação da época, era utilizado como aditivo hidrófugo. Este óleo com cal formava um material chamado "gala-gala", comumente usado nos Açores e Brasil (Veiga, 2008 in Eires, 2012). Em Portugal, a cal viva hidratada a quente com óleos ou gorduras também era usada para estabilizar as paredes de terra ou argamassas. Foi mencionado também este tipo de uso em edifícios tradicionais construídos em terra e madeira em Lisboa (CML, 2005 in Eires, 2012). 

Relativamente à conexão entre a cal e os biopolímeros é referido por Čechová que em ambientes básicos, por exemplo, em argamassas à base de terra e cal ou em solo estabilizado com cal, com a adição de óleos ou gorduras os triglicérois, presentes na sua constituição, quando hidratados, resultam em sais insolúveis de cálcio de ácidos gordos. Estes sais são hidrófugos e conectam-se bem com o cálcio da cal e proporcionando maior repelência à água (Čechová, 2009). 

Na Universidade do Minho, foi desenvolvido um trabalho de pesquisa sobre o estudo da estabilização de solo com cal e biopolímeros, adaptando o conhecimento antigo para melhorar a durabilidade relacionada com a ação da água. O principal objetivo do estudo era conseguir uma estabilização do solo adequada para a construção com terra compactada (taipa ou blocos de terra compactados, BTC) sem revestimento adicional, obtendo boa durabilidade contra a ação da água sem comprometer o potencial estético do material da terra. Desta forma, desenvolveu-se um estudo geral relacionado com a incorporação de biopolímeros (amido de milho, farinha de trigo, açúcar, óleo de linhaça, glicerol, caseína, óleo de cozinha usado e compostos de água de pasta de celulose e de palha) e aditivos minerais (hidróxido de sódio, silicato de sódio, alúmen, cloreto de cálcio, cloreto de sódio e borato de sódio). 

A percentagem adicionada de biopolímeros fixou-se em 0,4% e 1,0% da massa de solo e a percentagem de aditivos minerais foi 0,1%. 

Os principais resultados obtidos, relativamente à absorção de água por capilaridade e resistência à compressão no estado saturado, mostraram que, entre os biopolímeros testados, os óleos proporcionavam um melhor comportamento e entre os aditivos minerais testados o hidróxido de sódio apresentava melhores resultados, (Eires, 2012). 

Foi também testada a estabilização de solo com: cal viva (CV), cal hidratada (CH) e cimento (C) (4% da massa de solo por cada estabilizante), óleo de cozinha usado (O) (1,0% da massa de solo), e a adição simultânea de hidróxido de sódio (CV_NaOH e CV_O_NaOH) (0,1% da massa de solo), cujos principais resultados se encontram na Figura 7, Eires (2012). 







Estes resultados mostram que o solo estabilizado com cal viva mostrou um melhor desempenho, acima de tudo, com a adição de óleo de cozinha usado e hidróxido de sódio.

Comparando o solo de referência, não estabilizado (REF), com as composições de solo com cal viva (CV) os resultados dos ensaios de resistência à compressão revelam: um aumento de 102% sobre a resistência devido à estabilização com cal viva; um aumento de 131% com adição complementar de óleo (CV_O); e um aumento de 150% com adição simultânea de óleo e de hidróxido de sódio (CV_O_NaOH). 

As composições com cal viva e óleo também mostraram um bom desempenho na absorção de água por capilaridade (diminuição de água absorvida em cerca de 95%). Em testes de erosão acelerada, usando um jato em spray para simular a ação de chuva, estas composições de cal viva com óleo também apresentaram bons resultados, com uma erosão reduzida, apresentando uma redução da erosão face ao solo de referência de 99,5% (Eires, 2012).

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